Parceiros

sexta-feira, 31 de março de 2017

Aldina Duarte - Mãe




















 Mãe, eu quero ir me embora. 
 A vida não é nada daquilo que disseste, quando os meus seios começaram a crescer.
 O amor foi tão parco, a solidão tão grande. Murcharam tão depressa, as rosas que me deram, se é que me deram flores.
 Já não tenho a certeza mas tu deves lembrar-te, porque disseste que isso ia acontecer.
 Mãe, eu quero ir me embora. 
 Os meus sonhos estão cheios de pedras e de terra. E quando fecho os olhos, só vejo uns olhos parados no meu rosto e nada mais que a escuridão por cima. 
 Ainda por cima, matei todos os sonhos que tiveste para mim. Tenho a casa vazia, deitei-me com mais homens do que aqueles que amei e o que amei de verdade, nunca acordou comigo.
 Mãe, eu quero ir me embora. 
 Nenhum sorriso abre caminho no meu rosto, e os beijos azedam na minha boca.
 Tu sabes que não gosto de deixar-te sozinha mas desta vez não chames pelo meu nome, não me peças que fique. 
 As lágrimas impedem-me de caminhar e eu tenho de ir me embora. Tu sabes...
 A tinta com que escrevo é o sangue de uma ferida que se foi encostando ao meu peito como uma cama se afeiçoa a um corpo que vai vendo crescer. 
 Mãe, eu vou me embora. 
 Esperei a vida inteira por quem nunca me amou e perdi tudo, até o medo de morrer.
 A esta hora, as ruas estão desertas e as janelas convidam à viagem. 
 Para ficar bastava me uma voz que me chamasse mas essa voz, tu sabes... Não é a tua .
 A ultima canção sobre o meu corpo, já foi à muito tempo e desde então, os dias foram sempre tão compridos. E o amor tão parco, e a solidão tão grande.
 E as rosas que disseste que um dia chegariam virão já amanha, mas desta vez tu sabes... Não as verei murchar.

Aldina Duarte









Sem comentários:

Enviar um comentário

Parceiros